domingo, 23 de janeiro de 2011

Jorge Neto

O “Leão dos Palcos”

A música entrou-lhe pela vida adentro, quando deu por ela já era estrela e “animal de palcos”, porque é junto do povo que a sua existência faz sentido. Goste-se ou não do estilo, uma coisa é inegável: conhecemos um grande profissional e um homem bom
Na sua vida as coisas foram acontecendo naturalmente, quando deu por ela as fãs não o largavam e o seu nome surgia em incertas da imprensa lusófona. O menino franzino nascido em S. Tomé e Príncipe, cabo-verdiano de coração, português e holandês por razão dessa inevitável Diáspora crioula, fez-se gente e “artista de variedades”. E, seguramente, o seu nome ficará para sempre ligado à História da Música Cabo-verdiana. Já lá vão vinte e dois anos, com altos e baixos, “aprendendo sempre com os erros e os disparates”, Jorge Neto fez mais uma passagem pelas ilhas natais dos progenitores e sua [dele mesmo] pátria amada, onde sempre regressa “porque é esta a minha casa” [Jorge Neto, dixit].
O lado acidental da sua vivência começa logo no ato de nascer. Filho de emigrantes, andarilhos deste Mundo onde é preciso labutar pela sorte de uma vida digna, Jorge tem as primeiras imagens de vida ainda em S. Tomé, logo depois Portugal e essa Lisboa de diversidades e culturas, segunda pátria de crioulos, para mais tarde dar o salto, mais a norte, para a Holanda. Refratário ao serviço militar, o crioulo de S. Tomé, “entre a guerra e a paz” ali encontrou os primeiros apelos daquela que, inexorável, havia de ser vivência mais pungente: a Música.
Por detrás da estrela, a simplicidade
Foi tempo dos Livity, a banda formada corriam os alvores da década de noventa, que correu na Diáspora, aportou ao arquipélago e o afirmou como estrela acidental da música cabo-verdiana – banda agora “ressuscitada”, consolidada a carreira a solo e a fama que sempre o persegue e, não raras vezes, se crava em si qual claustrofobia. Porque os tiques de estrela são coisa que Jorge, passado o primeiro deslumbramento, não cultiva. Na Praia, onde o fomos encontrar, o cantor hospeda-se na Residencial Benfica, uma confortável mas modesta pensão. Percebe-se ser ali que se sente bem, no meio do seu povo e longe da mundivivência chique – e tão plastificada – dos hotéis da capital cabo-verdiana.
Entre cervejas, uns uísques e uns grogues, a conversa decorre prazenteira e solta, revelando um homem que se revê nas origens, que gosta de coisas simples e se afirma cidadão de seu tempo. “Dez anos de poder já chega, agora é preciso mudar as coisas, porque a democracia é dar a voz ao povo”, diz-nos com o olhar perdido num ponto longínquo e intemporal, como que a vislumbrar tempo novo e a passar subtil recado…
Na sua vida, como se dizia, as coisas foram acontecendo. Um concurso onde se inscreve e ganha posição cimeira, um outro que reafirma a liderança e, quase sem dar por isso, Jorge Neto vê-se protagonista do estrelato onde se mantém, “com muito trabalho e sofrimento”, mas também “tantas alegrias”, há mais de vinte anos.
Aos 45, portador de tripla nacionalidade [cabo-verdiana, portuguesa e holandesa], Neto mantém-se fiel ao “Kolazouk” o estilo que vem cultivando, entre o funana e músicas desse mundo afora onde, bem cedo, se fez à estrada.
Uauuuu! – o grito de guerra que lhe deu cognome de “Leão dos Palcos”, enforma uma receita de sucesso, entre o pulsar da música e coreografias trabalhadas ao milímetro, entrincheiradas no grande dançarino que é, dando colorido e vida aos palcos já pequenos para a sua dimensão. O povo, esse, em cada gesto, em cada palavra, em cada olhar cúmplice, percebe-se amar o homem simples por detrás da estrela que imortalizou “Rosinha”.  

Tiques de estrela são coisa que Jorge não cultiva. Na Praia, o cantor hospeda-se numa confortável mas modesta pensão. Percebe-se ser ali que se sente bem, no meio do seu povo e longe da mundivivência chique da capital

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